terça-feira, 30 de novembro de 2010

divulgação












O que é Juventude Libertária da Resistência Popular

Auto-descrição da JULI-RP
" (…) A Resistência Popular é a coordenação solidária que agrupa diversas expressões do movimento social pautadas pelo caráter combativo e autônomo, pelos princípios da ação direta, classismo, solidariedade de classe, horizontalidade, democracia direta e protagonismo popular. Foi fundada em 1999. A Juventude Libertária da Resistência Popular (JULI-RP) surge da necessidade de organização de militantes que participavam de diferentes grupos que compunham a RP, cujas formas de atuação e projetos eram semelhantes dentro do Movimento Estudantil. Para nós, o Movimento Estudantil só tem sentido se for entendido como um movimento social, também capaz de ser transformador da realidade. Acreditamos que a luta dos estudantes não deve ser isolada, mas unida a outras lutas, pois uma real mudança na educação só pode vir acompanhada de uma mudança em toda a sociedade. Propomos que os estudantes estejam organizados horizontalmente, se opondo à atual forma de organização do movimento estudantil, caracterizada pelo aparelhismo partidário e pela burocracia, que lhes usurpam o direito de participação direta nas discussões e lutas que envolvem a todos. (…)"




segunda-feira, 29 de novembro de 2010


(1756-1835)

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          Escritor e filósofo inglês, considerado o percursor do pensamento anarquista moderno, nasceu em 3 de março de 1756 em Wisbeach de uma família de dissidentes calvinistas.
          Seguindo a tradição da família, estudou teologia e foi nomeado pregador em 1778, chegando a ser pastor em diversas comunidades dissidentes até 1883. Influenciado pelas idéias da Revolução Francesa, sobretudo de Rousseau e Helvétius, afastou-se da religião, iniciando então sua reflexão sobre a realidade social.
          Nessa época ligou-se a um famoso grupo de intelectuais e trabalhadores revolucionários que se reuniam nas tabernas de Londres, tornando-se amigo de Thomas Paine, autor de Os Direitos do Homem. Em 1791 conheceu, nesse círculo, a que seria sua companheira Mary Wollstonecraft, percursora do feminismo, que em 1792 publicou a Reivindicação dos Direitos da Mulher. Dessa relação nasceu Mary Wollstonecraft Godwin futura companheira do poeta Shelley e autora da novela Frankstein.
          A partir de 1871 começou a elaborar seu livro Investigação Acerca da Justiça Política, editado em 1873. O livro causou escândalo e polêmica na sociedade inglesa pelas suas idéias filosóficas e políticas revolucionárias, tornando Godwin famoso.
          Nos anos seguintes escreveria várias obras literárias, das quais a mais famosa é Caleb Williams (1794), onde volta a expor suas idéias na forma literária. Godwin é o primeiro pensador a considerar que todo o estado e todo o governo é um mal, e que a sociedade poderia existir sem eles, sendo considerado um percursor do anarquismo moderno.
          Aquele que foi um autor famoso, morreu anonimamente em março de 1836, quando começava a se desenvolver o movimento socialista que iria aprofundar as idéias inovadoras que tinha analisado na sua obra.

PROUDHON, Pierre–Joseph


(1809-1865)

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          Aquele que Bakunin considerava o mestre de todos os anarquistas, nasceu em França em 1809, numa família do povo.
          Operário, tipógrafo, autodidata, desenvolveu suas próprias teorias sobre organização social, baseada na cooperação e mutualismo. Em 1840 publicou o livro O Que é a Propriedade?, onde se declara pela primeira vez anarquista. O livro foi elogiado por Marx, que o tentaria atrair mais tarde (1846) para um grupo de pensadores socialistas. No entanto, Proudhon na resposta a Marx questiona a criação de novos dogmas, o que levaria à ruptura com o socialista alemão.
          Nessa época, 1844-1845, teve encontros em Paris com Bakunin e Marx. Mas logo em 1846 Marx escreveu o livro Miséria da Filosofia que é uma crítica violenta ao livro de Proudhon a Filosofia da Miséria.
          Em 1848 Proudhon foi eleito deputado à Assembléia Nacional por Paris. Em julho desse ano pronunciou uma discurso violento na Assembléia onde expõe a oposição entre proletários e burgueses, sendo objeto de advertência pelo Presidente do parlamento.
          No ano seguinte Proudhon tentou organizar o Banco do Povo, que não conseguiu prosperar. Seus artigos no jornal Representant du Peuple e Le Peuple valem-lhe vários processos judiciais que o obrigam a se exilar na Bélgica.
          De volta à França foi preso em 1849 tendo ficado na prisão até 1852, onde continuou escrevendo.
          A edição do livro De la Justice dans la Révolution et dans L'Eglise, esgotado em poucos dias, provocou novo escândalo e um novo processo judicial, que o obrigou a exilar-se, novamente, em Bruxelas.
          Regressou a França onde publicou novos livros entre os quais o Princípio Federativo e Da Capacidade Política das Classes Trabalhadoras que forneceu a base teórica do anarco-sindicalismo, defendendo que o "proletariado deve emancipar-se sozinho". Morreu em 1865, pouco depois da fundação da Primeira Internacional, criada em grande parte por iniciativa de operários mutualistas franceses.

BAKUNIN, Mikhail


(1814-1876)

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          O mais brilhante dos teóricos e agitadores anarquistas, nasceu em Premukhino, Rússia em 11 de maio de 1814, originário de uma rica família da nobreza russa.
          Depois de ter seguido a carreira militar, abandonou o exército em 1832, quando começou a opor-se ao czarismo. Mas a sua ligação a idéias progressistas se deu a partir das suas leituras de Hegel, a amizade com o revolucionário russo Herzen e principalmente a partir da sua viagem ao Ocidente em 1840, quando freqüentou a Universidade de Berlim e o círculo dos hegelianos de esquerda em Berlim e Dresden na Alemanha, colaborando na revista crítica Anais Alemães de Arnold Ruge.
          Em 1843, aproximou-se do pensamento socialista a partir do contato com Moïse Hess e Proudhon, só vindo no entanto a se tornar um anarquista já nos anos 60, no seu exílio europeu. Durante os anos de 1848-1849 tomou parte ativa nas rebeliões que ocorreram em Paris, Praga e em Dresden ao lado de seu amigo Richard Wagner. Preso após a rebelião de Dresden, esteve em prisões da Saxônia e da Áustria, tendo sido entregue à polícia do Czar.
          Depois de doze anos nas prisões czaristas, em 1861 conseguiu escapar para o ocidente, tendo vivido na Inglaterra, Suíça e Itália onde conheceu Giuseppe Fanelli que com ele colaboraria na divulgação do anarquismo em Espanha.
          Por todo lado em que passou Bakunin participou da agitação social e da fundação de associações revolucionárias, tornando-se o mais conhecido revolucionário da sua época. A atração que Bakunin exercia sobre os círculos revolucionários esteve na origem de um dos episódios mais polêmicos da sua vida, as relações que manteve entre 1869 e 1872 com Netchaiev (1847-1882) um jovem revolucionário russo ligado ao grupo de Vera Zassoulitch, descrito como um jovem fanático, frio e cínico, que viria a ser o autor do Catecismo Revolucionário. Netchaiev, não só provocou inúmeros conflitos nos círculos dos exilados russos, como manteve uma atividade revolucionária inconseqüente que provocou repercussões negativas na Rússia. O comportamento de Netchaiev e suas teorias de que o fim justificam os meios, completamente afastados da tradição anarquista, foram repudiados expressamente por Bakunin a partir de 1870.
          A adesão de Bakunin à AIT, em 1868, foi decisiva na evolução das discussões entre as concepções de socialismo de estado e de socialismo libertário. Bakunin e Guillaume, foram os principais representantes da corrente anarquista que se opunha a Marx. Durante o Congresso de Haia, em 1872, foi oficialmente expulso juntamente com anarquistas de vários países da Internacional pelos marxistas. O comportamento de Netchaiev viria a ser usado pelo grupo marxista da AIT como um dos argumentos para expulsar Bakunin da Primeira Internacional.
          Nos últimos anos da sua vida, Bakunin não deixou de acompanhar os movimentos revolucionárias que ocorreram na Europa, entre os quais a tentativa revolucionária de 1874 em Bolonha na Itália.
          Seus principais livros são Deus e o Estado; Federalismo, Socialismo e Antiteologismo e Estatismo e Anarquia.
          Faleceu em 1 de julho de 1876, em Berna, na Suíça.

STIRNER, Max


(1806-1856)

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          Pseudônimo do pensador alemão Kaspar Schmidt, nascido na Baviera, Alemanha, em 1806, filho de um artesão.
          De 1826 a 1828 estudou em Berlim, onde foi aluno de Hegel e Feuerbach, tendo voltada a essa universidade de 1832 a 1834. A partir de 1842 fez parte do círculo de intelectuais radicais Jovens Hegelianos que se reunia em torno de Arnold Ruge e Bruno Bauer, que tanto influenciaram Marx e Bakunin. Foi nas reuniões desse grupo que Engels o conheceu.
          Professor solitário, escreveu O Falso Princípio da Nossa Educação que seria publicado em 1842 por Marx na revista do grupo A Gazeta Renana.
          Seria no entanto O Único e sua Propriedade, publicado em 1884, que o iria tornar famoso, transformando-o no teórico do anarquismo individualista. Um dos alvos da crítica de Marx e Engels no livro A Ideologia Alemã seria Stirner, que rapidamente, no entanto, acabaria esquecido, vindo a ser redescoberto mais tarde por Henry Mackay.
          Sua vida, marcada pela pobreza e pela tragédia, certamente contribuíram para a elaboração de um pensamento que tem como centro o indivíduo solitário: o único que não deve sujeição a nada nem a ninguém. Seu livro valeu-lhe a celebridade e o escândalo: implodia com convenções, moral, mas também toda a doutrina social, política e filosófica de seu tempo. Ao afirmar: "livre não o sou em nenhum Estado" ou "todo o Estado é despótico". No entanto, sua idéia de um "eu" absoluto, mesmo quando ligada à sua concepção de um associativismo de egoístas, estava longe das idéias e valores que se expressaram no anarquismo social e mesmo no individualismo anarquista posterior. Stirner que se definia como Único, certamente o foi como pensador radical original, e nesse sentido é difícil classificá-lo, mesmo que por seu anti-estatismo e espírito herético era um libertário.
          O pensamento de Stirner no movimento anarquista teve uma influencia limitada, ganhando sua obra uma maior divulgação a partir de 1888, quando o poeta anarquista John Henry Mackay, escreveu sua biografia e algumas obras onde divulgava o anarquismo individualista. A partir de então suas teorias cativaram alguns círculos libertários alemães, norte-americanos e especialmente do individualismo francês, muito ativo no final do século XIX e começo do século atual.
          Morreu esquecido e na miséria aos 49 anos, a 25 de julho de 1856.

TOLSTOI, Liev


(1828-1910)

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          Este genial escritor russo nasceu em 1828 em Iasnaia Poliana. Filho de uma importante família ligada aos Czares, ficou órfão ainda criança.
          Entrou na Universidade de Kazan onde estudou línguas orientais e direito. Em 1847, por herança tornou-se senhor de vastas terras em Iasnaia-Poliana.
          Depois de ter servido no exército, em 1856, viajou pela Europa visitando vários países, regressando então à sua terra natal para administrar suas terras e dedicar-se à literatura.
          Em 1861, voltou novamente a França para visitar seu irmão que se estava doente aproveitando para se encontrar com Proudhon. Com uma vida pessoal cheia de conflitos e uma personalidade dividida, Tolstoi aproximou-se, gradualmente, de uma posição pacifista e anarquista, recusando toda a forma de governo e poder.
          Na sua terra natal criou uma escola marcadamente libertária, próxima das experiências de Ferrer e da Escola Moderna, tendo pessoalmente escrito os livros usados na escola.
          Seus textos autobiográficos A Minha Confissão e Qual é Minha Fé foram apreendidos mas, mesmo assim, tiveram ampla difusão clandestina.
          Perseguido e excomungado pela Igreja, seus últimos anos são de engajamento social. Os escritos filosóficos influenciaram o aparecimento de comunidades e de uma corrente de anarquismo cristão, sobretudo em França, Holanda e EUA.
          Exerceu também, juntamente com Kropotkin e Thoreau, forte influência sobre um dos mais importantes pacifistas modernos: Gandhi, com quem chegou a manter correspondência. Faleceu em 1910.

KROPOTKIN, Piotr


(1842-1921)

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          Escritor, filósofo e militante anarquista russo, nascido na nobreza russa em Moscou, em 1842.
          Depois de passar pelo Corpo de Pagens, já oficial, foi para a Sibéria onde realizou importantes levantamentos geográficos. Desligou-se do exército e tornou-se geógrafo, tendo percorrido a Sibéria e a Manchúria, onde pode conhecer de perto miséria dos povos sujeitos ao Czarismo.
          Em 1872, realizou uma viagem à Bélgica e à Suíça, onde entrou em contato com os anarquistas da Federação do Jura, tendo-se filiado na AIT.
          De volta à Rússia, começou uma militância em grupos clandestinos, o que o levaria aos cárceres czaristas. Depois de uma fuga espetacular, exilou-se no Ocidente, tendo retomado seus contatos com os anarquistas suíços, fundando e editando em Genebra, em 1879, o jornal Le Révolté, até ser novamente preso na França, em 1882.
          Libertado em 1885, depois de um amplo movimento de intelectuais e cientistas, entre os quais Herbert Spencer, Ernest Renan e Victor Hugo, refugiou-se na Inglaterra. Conviveu com os principais intelectuais da sua época e foi colaborador da Geographical Society. Em alguns de seus livros, Kropótkin tentou buscar uma base científica para o pensamento anarquista. E, se de sua pesquisa saíram trabalhos que ainda hoje desafiam o leitor, certamente incorreu também no erro de um racionalismo e otimismo científico típicos da sua época. Mas, foi certamente como propagandista revolucionário, que Kropótkin se tornou o mais traduzido e lido de todos os pensadores libertários.
          Seus livros faziam parte da biblioteca dos camponeses e operários em quase todos os países. Palavras de um Revoltado, Aos Jovens, Ética, O Estado e seu Papel na História tiveram edições em inúmeras línguas e em todos os continentes. O seu verbete sobre o anarquismo publicado na edição da Encyclopaedia Braitannica de 1910 é, até hoje, uma das mais bem elaboradas definições.
          Voltou à Rússia durante a Revolução de 1917. Crítico do autoritarismo comunista, escreveu a Lenin em março de 1920, denunciando a evolução autoritária que estava ocorrendo, divulgando, em junho, uma carta aberta aos trabalhadores do ocidente onde alertava para a evolução da Revolução Soviética. Em 21 de dezembro, voltou a fazer novas críticas em carta enviada ao dirigente comunista. Morreu em 8 de fevereiro de 1921. Seu funeral foi a última grande manifestação pública do anarquismo russo.
          Entre os seus principais livros estão A Conquista do Pão, Apoio Mútuo, Campos, Fábricas e Oficinas, Ética Anarquista e A Grande Revolução.

VASCO, Neno


(1878-1920)

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          Advogado, jornalista e escritor anarquista, nascido em Portugal a 9 de maio de 1878. Seu nome era Gregório Nazianzeno Moreira de Queirós e Vasconcelos, mas ficaria conhecido por Neno Vasco.
          Fez parte do grupo de estudantes da Universidade de Coimbra que aderiram ao anarquismo no começo do século.
          Formado em direito, emigrou para o Brasil em 1901, para se juntar a seu pai. Em São Paulo logo entrou em contato com anarquistas como Benjamim Mota, Ricardo Gonçalves e os libertários italianos. Participou então da edição de O Amigo do Povo, que começou a circular em 1902. Algum tempo depois lançou a revista Aurora. Este movimento editorial haveria de contribuir para o crescimento da influência libertária nos meios operários. Nas páginas da Voz do Trabalhador travou uma polêmica sobre as relações entre anarquismo e sindicalismo, que é fundamental para entender a forma como os libertários se situaram face ao movimento operário e suas organizações.
          Em 1911, regressou a Portugal onde continuou a desenvolver sua militância anarquista, colaborando com a imprensa anarquista brasileira como correspondente. Na revista anarquista portuguesa A Sementeira escreveu sobre a situação social no Brasil.
          Neno Vasco, licenciado em direito, intelectual brilhante, um dos mais influentes militantes libertários de Portugal e do Brasil, morreu de tuberculose e pobre em 1920, no norte de Portugal.
          O seu principal livro é A Concepção Anarquista do Sindicalismo, publicado em 1923 pela editorial do jornal anarco-sindicalista A Batalha e re-editado em 1984.

MALATESTA, Errico


(1853-1932)

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          Principal pensador anarquista italiano, nasceu em 1853 no sul de Itália, filho de uma família abastada.
          Desde jovem se iniciou em atividades contestatárias, que provocaram sua prisão em 1868 e a suspensão na Universidade de Nápoles, onde estudava medicina, em 1870.
          Em 1871 aderiu à Associação Internacional dos Trabalhadores e no ano seguinte conheceu Bakunin por ocasião do Congresso de Saint Imier, tendo esta relação tido uma influência decisiva em toda a sua militância anarquista posterior. Juntamente com Cafiero e outros militantes, em 1877, preparou o movimento "Levante de Benevento", que se tornou legendário na luta social italiana, quando um grupo anarquista percorreu essa região do sul de Itália distribuindo armas à população e queimando os arquivos públicos, declarando o comunismo libertário. Devido à sua militância libertária passou várias vezes pelas prisões.
          Na Congresso Anarquista de Londres de 1881 propôs a criação de uma Internacional Anarquista. Em 1885 exilou-se na Argentina, onde com os primeiro núcleos anarquistas desenvolveu uma ativa propaganda das idéias anarquistas, tendo publicado o jornal bilingüe Questione Sociale. Regressou à Europa em 1889 instalando-se em França, donde teve de partir para a Inglaterra.
          Tal como muitos outros militantes, também Malatesta desenvolveu atividade revolucionária em diferentes países: Egito, França, Bélgica, Argentina e Espanha são alguns dos países onde esteve.
          Em 1914, durante a Primeira Guerra Mundial foi um dos defensores do internacionalismo contra os que defendiam - mesmo dentro do anarquismo - o envolvimento com uma das facções beligerantes.
          Seu jornal Umanità Nuova tinha uma tiragem de 50.000 exemplares e era um dos animadores do anarco-sindicalismo italiano da USI.
          Morreu em 22 de julho de 1932 em pleno advento do fascismo sob liberdade vigiada. Uma das principais brigadas anarquistas da resistência italiana levou o seu nome.

PARSONS, Lucy


(1853-1942)

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          Militante operária e anarquista americana. Segundo seu depoimento seria filha de mãe mexicana e de um índio e após ficar órfã aos três anos foi levada para um rancho do Texas onde foi criada por um tio. Alguns pesquisadores, no entanto, acreditam que Lucy era filha de escravos do Texas.
          Em 1870, conheceu Albert Parsons, um ex-soldado confederal que se veio a tornar um republicano radical e mais tarde militante anarquista. Forçados a sair do Texas pelo seu casamento inter-racial foram para Chicago onde logo se ligaram aos setores revolucionários que começavam a desenvolver o movimento sindical.
          A partir de 1878 Lucy colabora no jornal O Socialista, a partir daí torna-se uma escritora e agitadora com um papel decisivo na organização operária de Chicago. Em 1883 foi uma das fundadoras da International Working People's Association (IWPA), uma importante organização anarquista internacionalista e defensora da ação direta que se distinguia por defender a igualdade das mulheres e dos negros. Lucy além de militar na organização era uma colaboradora regular do seu jornal O Alarme, onde apelava à ação direta contra os ricos e os poderosos.
          Muitos dos seus artigos tratavam também da questão do racismo e da discriminação defendendo a necessidade dos negros se integrar à luta social contra o capitalismo.
          Em 1886 a IPWA foi uma das organizações que desencadeou a greve geral em defesa das 8 horas de trabalho no primeiro de maio, que levou aos acontecimentos da Praça Haymarket e ao famoso processo dos Mártires de Chicago em que a justiça americana condenou à morte de três conhecidos militantes operários e anarquistas, entre os quais o Albert Parsons.
          Após o enforcamento do seu marido, manteve uma presença ativa no movimento operário e anarquista, participando em 1905 da fundação da confederação sindical revolucionária IWW e colaborou no jornal O Libertador. Nos anos 30, no contexto da avanço do nazi-fascismo, decidiu aderir ao Partido Comunista.
          Lucy Parsons morreu no incêndio da sua casa em 1942, após meio século de intensa militância, onde se destacou como uma das mais importantes mulheres do movimento operário e anarquista americano. Seus livros e documentos pessoais foram apreendidos arbitrariamente pela polícia após o incêndio.

GOLDMAN,Emma


(1868-1940)

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          Anarquista russa, nascida na Província de Kovno, a 27 de junho de 1868. Em 1882 foi com seus pais para São Petersburgo.
          Aos dezassete anos, influenciada pelo movimento intelectual russo no sentido de ir para o povo, tornou-se operária.
          Emigrou para os Estados Unidos em 1886, instalando-se em Rochester, onde acompanhou as lutas operárias pelas 8 horas de trabalho, que provocaram o enforcamento dos quatro militantes anarquistas de Chicago em 11 de novembro de 1887. Esse fato e a relação com ativistas como Joana Grei, J. Most e Voltarine de Cleyre, levaram Emma Goldman a aderir ao anarquismo. Mudou-se para Nova York onde iniciou sua atividade militante, sendo presa várias vezes. Em 1893 cumpriu um ano de prisão.
          Oradora famosa, foi uma das principais agitadoras anarquistas dos EUA, tendo sido a fundadora da importante revista libertária Mother Earth.
          Amiga e companheira de Alexander Berkman, lutou durante 14 anos pela sua libertação, o que só veio a ocorrer em 1906.
          Em 1919 foi expulsa junto com Berkman e mais de duzentos revolucionários para a Rússia. Mas logo foi obrigada a abandonar esse país por discordar dos métodos autoritários dos comunistas. Viajando pela Europa e Canadá fez conferências onde denunciou a repressão que se iniciava na Rússia.
          Com o começo da Revolução Espanhola, vai para Barcelona em 1936, percorrendo a Espanha em ações de agitação e apoio à causa revolucionária. Em Londres ajudou a fundar um grupo de coordenação da ajuda a Espanha.
          Lutadora da causa operária, defensora dos direitos da mulher e adepta do amor livre, Emma Goldaman, deixou seus escritos espalhados por inúmeras publicações de todo o mundo. Seus principais livros são Living My Life, Anarchism and Other Essays e Puritanismo e Outros Ensaios.
          Morreu em 14 de maio de 1940, aos setenta anos em Toronto, Canadá tendo sido sepultada em Chicago junto aos militantes operários assassinados no século XIX.

CLEYRE, Voltairine de


(1869-1912)

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          Ativa militantes e agitadora anarquista americana. Nasceu em 17 de novembro de 1869, em Michigan.
          Filha de um livre pensador de origem belga – seu nome é homenagem a Voltaire – foi educada num colégio católico no Canadá, de onde fugiu.
          Iniciou sua militância social como livre-pensadora, tornando-se anarquista na seqüência dos acontecimentos do Primeiro de Maio de 1886, em Chicago.
          Amiga do pensador anarquista Dyer Lum e de Emma Goldman, quando esta foi processada por sua militância em 1893, Voltairine escreveu o ópusculo Em Defesa de Emma Goldman do Direito de Expropriação. Em 1897 esteve em França e na Inglaterra, conhecendo em Londres Kropotkin e o grupo editor do jornal Freedom, estabelecendo também contato com os exilados espanhóis.
          Colaboradora da imprensa anarquista, principalmente da revista Mother Earth, escritora de mérito, conferencista famosa, percorreu os EUA fazendo propaganda das idéias libertárias. Muitas das traduções de obras anarquistas editadas nos EUA no final do século XIX, são de sua autoria.
          Depois de vinte e cinco anos de militância, Voltairine de Cleyne morreu aos 46 anos de idade, em junho de 1912, em Chicago, devido a um ferimento resultante de uma tentativa de assassinato anos antes.

READ, Herbert


(1893-1968)

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          Poeta e crítico de arte anarquista, nasceu em 1893 em Yorkshire, Inglaterra de uma família de agricultores.
          Foi conservador do Victoria and Albert Museum de Londres e professor de Arte na Universidade de Edimburgo, Cambridge, Liverpool, Londres e Harvard.
          Aproximou-se do anarquismo a partir de leituras de Kropotkin, Bakunine, Tolstoi e Ibsen.
          Seus livros Poesia e Anarquismo (1938), Educação pela Arte (1943), Arte e Alienação (1967), Filosofia do Anarquismo (1940), O meu Anarquismo (1966), explicitam a filosofia dum intelectual culto e irrecuperavelmente anarquista. Seu pacifismo e suas idéias sobre educação libertária, tornaram-no um dos autores anarquistas mais atuais.
          Herbert Read gostava de afirmar: "Uma civilização que, de maneira sistemática, recusa o valor da imaginação e a destrói, está condenada a soçobrar numa barbárie cada vez mais profunda".
          Morreu em 1968.

MOURA, Maria Lacerda


(1887-1945)

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          Professora, jornalista e escritora anarquista, nascida em Minas Gerais a 16 de maio de 1887.
          Desde cedo se interessou pelo pensamento social e pelas idéias anticlericais.
          Formou-se na Escola Normal de Barbacena, em 1904, começando a lecionar nessa mesmo escola. Inicia então um trabalho junto das mulheres da região, incentivando um mutirão para construção de casas populares para a população carente da cidade. Fundou a Liga Contra o Analfabetismo, e como educadora adotou a pedagogia libertária de Ferrer.
          Após de mudar para São Paulo, começou a dar aulas particulares e a colaborar na imprensa operária e anarquista brasileira e internacional.
          No jornal A Plebe escreveu principalmente sobre pedagogia e educação. Ativa conferencista, tratava de temas como educação, direitos da mulher, amor livre e antimilitarismo, tornando-se conhecida não só no Brasil, mas também no Uruguai e Argentina onde foi convidada por grupos anarquistas.
          Em fevereiro de 1923 lançou a revista Renascença, uma publicação cultural que foi divulgada no movimento anarquista e entre setores progressistas e livre-pensadores.
          Pode ser considerada uma pioneira das principais pioneiras do feminismo no Brasil e uma das poucas que se envolveu com o movimento operário e sindical.
          Entre seus livros destacam-se: Em torno da educação; A Mulher Moderna e o seu papel na Sociedade Atual; Amai e não vos Multipliqueis; Han Ryner e o Amor Plural.

MONTSENY, Federica


(1905-1994)

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          Militante anarquista espanhola.
          Nasceu em Madri filha de dois dos mais conhecidos anarquistas catalães Joan Montseny (Federico Urales) e Teresa Mané (Soledad Gustavo), fundadores em 1898 de uma das mais importantes publicações do anarquismo ibérico, a Revista Blanca.
          Desde cedo Federica Montseny militou na CNT, tornando-se famosa como oradora, ao mesmo tempo que colaborava com as atividades editoriais de sua família. Em 1930, passa a viver com o também militante anarquista Germinal Esgleas.
          A partir de 1936 integra o comitê regional da CNT e o comitê pninsular da FAI.
          Durante a Revolução foi escolhida para integrar o Governo Republicano como ministra da saúde. Esta participação embora tenha obtido um amplo apoio do movimento, gerou polêmica e divisões entre os anarquistas. Durante o tempo em que foi ministra aprovou uma lei legalizando o aborto. Com a derrota exilou-se em França, onde esteve várias vezes presa.
          Foi uma personagem central do Movimento Libertário no exílio, mantendo ao longo de toda a sua vida uma atividade militante, fazendo parte do grupo que se opôs ao frentismo e colaboracionismo político. No entanto, contraditóriamente, mereceu críticas, entre setores das Juventudes Libertárias, por se opor às tentativas de manter atividades clandestinas em Espanha, principalmente ações armadas.
          Faleceu em Toulouse (França) a 14 de janeiro de 1994.

BOOKCHIN, Murray


(1921-)

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          Pensador e militante anarquista contemporâneo, nascido nos EUA em 1921, filho de operários de origem russa, militantes da IWW.
          Depois de ter sido militante comunista, rompeu nos anos 50, com o marxismo-leninismo, influenciado pela Revolução Espanhola e pela Revolução Húngara de 1956. A partir daí, tornou-se anarquista, sendo considerado hoje um dos principais teóricos do pensamento libertário.
          Ligado aos movimentos alternativos, participou das lutas dos anos 60 pelos direitos civis e contra a guerra do Vietnã. Em 1968 foi para Paris, onde acabou participando das lutas de maio.
          Sua reflexão centra-se sobre a ecologia social, os problemas urbanos e a implantação de um municipalismo libertário, sendo seu primeiro livro sobre ecologia de 1962.
          Foi professor da Alternative University de Nova York e fundador do Institut For Social Ecology.
          Editor da revista Anarchos, Bookchin é o exemplo de intelectual independente, capaz de conciliar uma militância social com uma reflexão crítica. Entre os seus principais livros destacam-se El Anarquismo en la Sociedad de Consumo, Remaking Society, Listen, Marxist e Third Revolution.

CHOMSKY, Noam


(1928-    )

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          Importante lingüista contemporâneo, nascido em 1928 nos EUA, filho de pais ucranianos, é também um dos mais lúcidos e críticos pensadores contemporâneos.
          Desde cedo relacionou-se com círculos judeus anarco-sindicalista e ainda criança manifestou sua solidariedade com a Revolução Espanhola.
          Nos anos 60, já famoso por suas pesquisas na área de linguística, envolveu-se no movimento de oposição à guerra do Vietnã.
          Mesmo sendo hoje o mais citado e conhecido pensador americano, Chomsky é marginalizado pelos grandes meios de comunicação dos EUA. Não é por acaso, um dos temas que tem estado no centro de sua pesquisa nas últimas décadas, tem sido o poder manipulatório dos mass media, da grande imprensa à televisão.
          Atento observador da cena internacional, Chomsky tem tido posições solidárias e críticas em todas as situações de conflito internacional, do Vietnã, à América Latina, da Palestina a Timor.
          Libertário, conhecedor da história do anarquismo, Noam Chomsky afirma-se como um partidário da tradição federalista e de auto-governo. Atualmente é diretor do Departamento de Línguas do Instituto de Tecnologia de Massachusetts (MIT).
          Entre os seus livros mais importantes encontram-se Ilusiones Necesarias: Controle del Pensamiento en las Sociedades Democraticas, Radical Priorities, 501: A Conquista Continua e Novas e Velhas Ordens.



WILLIAM GODWIN































Algumas palavras aos meus jovens irmãos da Rússia (1869)


Introdução
 Notas sobre Bakunin e a prática de “Ir ao Povo”


No excelente prólogo que o historiador Max Nettlau escreveu ao livro “Estatismo e Anarquia” publicado na edição francesa das Obras Completas de Bakunin se lê:

“Durante os três meses de 1972 houve a redor de Bakunin uma vida intensa, inspirou abnegação a muitos jovens, homens e mulheres, que logo se lançaram de corpo e alma a difícil propaganda popular na Rússia; que “foram ao povo” e que quase todos e todas, depois de algumas semanas, meses, ou raramente anos de agitação, caíram nas prisões para anos de calabouço preventivo e, depois do processo, por dezenas de anos na Sibéria. Ross, um dos últimos, caiu também, no começo de 1876; foram aproximadamente 25 anos para livrar-se de novo da Sibéria e do internamento em províncias, para voltar de novo ao ocidente alguns anos mai tarde; no atual momento, já octogenário, ainda vive, assim como também Z. Ralli.” [1]

A esta juventude, a estes valentes e sinceros lutadores, aos primeiros homens e mulheres combatentes anarquistas, foi escrita a carta “Algumas palavras aos meus jovens irmãos da Rússia” no ano de 1869.

Para Bakunin a tarefa da juventude consistia em situar-se na vanguarda das lutas do proletariado e dos camponeses. Para isso, era necessário que os jovens, com certo nível de politização, provenientes em sua maioria dos setores médios, assumissem a tarefa de servir como vanguarda do movimento popular de libertação.

Citando o apêndice A da primeira edição de “Estatismo e Anarquia” em 1873 de Bakunin, aponta Nettlau:

“O que pode fazer o nosso proletariado intelectual, a juventude revolucionária-socialista russa, íntegra, sincera e devotada ao extremo? Ela deve sem dúvida ir ao povo (idti y narod), porque, hoje, em todo o mundo, mas sobretudo na Rússia, fora do povo, fora dos milhões e milhões de proletários, não há mais, nem existência, nem causa, nem futuro. Mas como e com que objetivos ir o povo?"[2]

Ir ao povo implica atuar desde o povo, com ele e por ele. Contrária as posições de Lavrov ou de Marx, que preconizavam a educação do povo através dos mestres ou a sujeição do povo a política do partido composto por intelectuais e pequeno-burgueses afastados da realidade do proletariado e dos camponeses, Bakunin sustentou sempre a necessidade de fundir-se na vida popular, de ser povo e através desse pertencimento, dessa constatação da realidade, receber do povo a força elementar e o seu fundamento, mas em troca disso, lhes fornecer os conhecimentos positivos, o hábito da abstração e generalização e a capacidade de organizar e construir sindicatos que, por sua vez, criam uma força criativa consciente sem a qual toda vitória é impossível. [3]

A tarefa dos revolucionários não é “dialogar” ou “doutrinar” o povo trabalhador, nem muito menos “ajudar a desenvolver um pensamento revolucionário”, pelo contrário, longe destas pretensões claramente dirigistas e/ou idealistas e pequeno-burguesas, os revolucionários devem lutar para constituir-se na vanguarda consciente do proletariado, e para isso é preciso ser proletário, é preciso, acima de tudo, abraçar o Anarquismo Revolucionário e a luta pela Liberdade e pelo Socialismo. 

“É preciso associar os melhores camponeses entre si e com os melhores operários das fábricas. É preciso instruir-lhes sobre o caráter geral da miséria na Rússia, sobre as forças elementares do povo, sobre a falta de coesão popular. Um periódico, incluindo notícias orais lhe informariam sobre as revoltas locais e sobre os movimentos revolucionários do ocidente. O povo deve ver a juventude em seu seio, trabalhando, na vanguarda de cada rebelião, consagrando-se a morrer na luta. A juventude deve trabalhar segundo um plano bem refletido e submetendo-se a mais forte disciplina para produzir essa unanimidade sem a qual não pode existir vitória. Deve educar ela mesma e educar ao povo não só para a resistência desesperada, como também para o ataques ousado. O proletariado não tem para si outra via de ação sem ser esta.” [4]

Depois de dezenas de anos que se escreveu estas palavras, Ir ao Povo, ainda continuam com plena vigência. A opressão brutal do proletariado e dos camponeses sob a bota do Csar e dos proprietários de terra perdura ainda atualmente sobre o conjunto dos explorados e oprimidos através da Ditadura do Capital/Imperialismo.

Este caminho apontado a quase 130 anos foi uma via traçada para a juventude revolucionária russa por Bakunin (e que) foi seguida pelos melhores, uma verdadeira elite de abnegação, homens e mulheres.”[5] Esta elite revolucionária é a que nós anarquistas revolucionários justamente lutamos para reconstruir em pleno século XXI.

Seguir o glorioso exemplo de Bakunin e de inumeráveis combatentes da classe operária e do povo oprimido através dos anos é a tarefa do momento.

IR AO POVO!
Abraçar o Anarquismo Revolucionário para alcançar a vitória!

Organização Popular Anarquista Revolucionária
Julho de 2008  

Carta ao Czar Nicolau I (setembro, 1851)



CARTA AO CZAR NICOLAU I*
Mikhail Bakunin

Não digo que eu fosse desprovido de amor-próprio, mas jamais este sentimento me dominou; ao contrário, fui obrigado a lutar contra mim mesmo e contra minha natureza toda vez que me preparava para falar publicamente ou mesmo para escrever para o público. Eu não tinha também esses vícios enormes, ao modo Danton ou Mirabeau, eu não conhecia essa depravação ilimitada e insaciável que, para se satisfazer, está pronta a chocar o mundo inteiro.

E se eu sofresse de egoísmo, este egoísmo seria unicamente necessidade de movimento, necessidade de ação. Sempre houve em minha natureza um defeito capital: o amor pelo fantástico, pelas aventuras extraordinárias e inauditas, ações abrindo à visão de horizontes ilimitados e das quais ninguém pode prever onde vai desembocar. Numa existência ordinária e calma eu sufocava, sentia-me mal em minha pele. Os homens procuram ordinariamente a tranqüilidade e a consideram como o bem supremo; no que me concerne, ela me mergulhava no desespero; minha alma se encontrava em perpétua agitação, exigindo ação, movimento e vida.


Eu deveria ter na nascido em algum lugar nas florestas americanas, entre os colonos do Far West, lá onde a civilização está ainda em seu início e onde toda existência nada mais é do que uma luta incessante contra homens selvagens e contra a natureza virgem, e não numa sociedade burguesa organizada. E, também, se desde minha juventude o destino tivesse querido fazer de mim um marinheiro, eu seria ainda hoje, provavelmente, um bom homem, eu não teria pensado na política e não teria procurado outras aventuras e tempestades a não ser as do mar. Mas o destino decidiu de outra forma e minha necessidade de movimento e de ação permaneceu insatisfeita. Esta necessidade , junta, em seguida, à exaltação democrática, foi, por assim dizer, minha única motivação. No que concerne a esta exaltação, ela pode ser definida em poucas palavras: o amor pela liberdade e um ódio invencível por toda opressão, ódio ainda mais intenso quando esta opressão dizia respeito a outra pessoa, e não a mim mesmo. Procurar minha felicidade na felicidade do outro, minha dignidade pessoal na dignidade de todos aqueles que me cercavam, ser livre na liberdade dos outros, eis todo meu credo, a aspiração de toda minha vida. Eu considerava como o mais sagrado dos deveres o de me revoltar contra toda opressão, fosse o autor ou a vitima. Sempre houve em mim muito de Dom Quixote, não somente na política, mas também em minha vida privada; eu não podia ver, com olhar indiferente, a mínima injustiça, e, por uma razão ainda mais forte, uma gritante opressão; algumas vezes, sem ter a competência nem o direito, eu me intrometi, de modo irrefletido, nos problemas dos outros e cometi, também, durante uma existência agitada, mas vazia e inútil, muitas besteiras, incorri em muitas contrariedades e fiz inúmeros inimigos, sem odiar, por assim dizer, ninguém. Eis, Sire, a verdadeira chave de todos meus atos insensatos, de meus pecados e de meus crimes. Se falo disso com esta segurança e com esta clareza, é que eu tive, durante estes dois últimos anos, bastante tempo para estudar a mim mesmo e para refletir sobre meu passado; agora me vejo com indiferença, como se pode ver um moribundo ou um morto.

* Fragmento da Confissão ao Czar Nicolau I, Petersburgo, Fortaleza de Pedro e Paulo, 27 de setembro de 1851.

Algumas palavras aos meus jovens irmãos da Rússia (1869)


Introdução
 Notas sobre Bakunin e a prática de “Ir ao Povo”


No excelente prólogo que o historiador Max Nettlau escreveu ao livro “Estatismo e Anarquia” publicado na edição francesa das Obras Completas de Bakunin se lê:

“Durante os três meses de 1972 houve a redor de Bakunin uma vida intensa, inspirou abnegação a muitos jovens, homens e mulheres, que logo se lançaram de corpo e alma a difícil propaganda popular na Rússia; que “foram ao povo” e que quase todos e todas, depois de algumas semanas, meses, ou raramente anos de agitação, caíram nas prisões para anos de calabouço preventivo e, depois do processo, por dezenas de anos na Sibéria. Ross, um dos últimos, caiu também, no começo de 1876; foram aproximadamente 25 anos para livrar-se de novo da Sibéria e do internamento em províncias, para voltar de novo ao ocidente alguns anos mai tarde; no atual momento, já octogenário, ainda vive, assim como também Z. Ralli.” [1]

A esta juventude, a estes valentes e sinceros lutadores, aos primeiros homens e mulheres combatentes anarquistas, foi escrita a carta “Algumas palavras aos meus jovens irmãos da Rússia” no ano de 1869.

Para Bakunin a tarefa da juventude consistia em situar-se na vanguarda das lutas do proletariado e dos camponeses. Para isso, era necessário que os jovens, com certo nível de politização, provenientes em sua maioria dos setores médios, assumissem a tarefa de servir como vanguarda do movimento popular de libertação.

Citando o apêndice A da primeira edição de “Estatismo e Anarquia” em 1873 de Bakunin, aponta Nettlau:

“O que pode fazer o nosso proletariado intelectual, a juventude revolucionária-socialista russa, íntegra, sincera e devotada ao extremo? Ela deve sem dúvida ir ao povo (idti y narod), porque, hoje, em todo o mundo, mas sobretudo na Rússia, fora do povo, fora dos milhões e milhões de proletários, não há mais, nem existência, nem causa, nem futuro. Mas como e com que objetivos ir o povo?"[2]

Ir ao povo implica atuar desde o povo, com ele e por ele. Contrária as posições de Lavrov ou de Marx, que preconizavam a educação do povo através dos mestres ou a sujeição do povo a política do partido composto por intelectuais e pequeno-burgueses afastados da realidade do proletariado e dos camponeses, Bakunin sustentou sempre a necessidade de fundir-se na vida popular, de ser povo e através desse pertencimento, dessa constatação da realidade, receber do povo a força elementar e o seu fundamento, mas em troca disso, lhes fornecer os conhecimentos positivos, o hábito da abstração e generalização e a capacidade de organizar e construir sindicatos que, por sua vez, criam uma força criativa consciente sem a qual toda vitória é impossível. [3]

A tarefa dos revolucionários não é “dialogar” ou “doutrinar” o povo trabalhador, nem muito menos “ajudar a desenvolver um pensamento revolucionário”, pelo contrário, longe destas pretensões claramente dirigistas e/ou idealistas e pequeno-burguesas, os revolucionários devem lutar para constituir-se na vanguarda consciente do proletariado, e para isso é preciso ser proletário, é preciso, acima de tudo, abraçar o Anarquismo Revolucionário e a luta pela Liberdade e pelo Socialismo. 

“É preciso associar os melhores camponeses entre si e com os melhores operários das fábricas. É preciso instruir-lhes sobre o caráter geral da miséria na Rússia, sobre as forças elementares do povo, sobre a falta de coesão popular. Um periódico, incluindo notícias orais lhe informariam sobre as revoltas locais e sobre os movimentos revolucionários do ocidente. O povo deve ver a juventude em seu seio, trabalhando, na vanguarda de cada rebelião, consagrando-se a morrer na luta. A juventude deve trabalhar segundo um plano bem refletido e submetendo-se a mais forte disciplina para produzir essa unanimidade sem a qual não pode existir vitória. Deve educar ela mesma e educar ao povo não só para a resistência desesperada, como também para o ataques ousado. O proletariado não tem para si outra via de ação sem ser esta.” [4]

Depois de dezenas de anos que se escreveu estas palavras, Ir ao Povo, ainda continuam com plena vigência. A opressão brutal do proletariado e dos camponeses sob a bota do Csar e dos proprietários de terra perdura ainda atualmente sobre o conjunto dos explorados e oprimidos através da Ditadura do Capital/Imperialismo.

Este caminho apontado a quase 130 anos foi uma via traçada para a juventude revolucionária russa por Bakunin (e que) foi seguida pelos melhores, uma verdadeira elite de abnegação, homens e mulheres.”[5] Esta elite revolucionária é a que nós anarquistas revolucionários justamente lutamos para reconstruir em pleno século XXI.

Seguir o glorioso exemplo de Bakunin e de inumeráveis combatentes da classe operária e do povo oprimido através dos anos é a tarefa do momento.

IR AO POVO!
Abraçar o Anarquismo Revolucionário para alcançar a vitória!

Organização Popular Anarquista Revolucionária
Julho de 2008  

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 Algumas palavras aos meus jovens irmãos da Rússia
(1869)


Levantaram de novo. Então, não conseguiram enterrar-vos. Esse espírito destrutivo do Estado que os encoraja, não é uma conseqüência do produto efêmero de uma exaltação juvenil, senão a expressão de uma necessidade vital e de uma paixão real, que surge das profundezas da vida popular.

Se vossas tendências revolucionárias não passassem de uma doença superficial, passageira, a simples ardência de uma vaidade juvenil, os meios heróicos que nosso governo tem empregado para destruir-vos, haver-se-ia já alcançado êxito a muito tempo. Faz muito tempo que vocês, renunciando a perigosa mania de pensar, rejeitando a tudo o que é humano no homem, haveriam se transformado em seres mais embrutecidos, entre a multidão de seres embrutecidos, oficiais e condecorados, que roubam o povo e devoram o país. Teriam merecido a indicação compatriota <>.

Apesar da sua tenra idade, a juventude culta e desclasada[6] da Rússia suportou uma série de tempestades. Em meus tempos, sob o regime ingenuamente despótico do imperador Nicolás seria preciso mais de vinte anos para passar pela metade das provas que vocês suportaram durantes estes oito ou nove anos. 

Após os incêndios de 1861, durante e depois da insurreição polaca e, sobre tudo, depois do ato executado por Karakosov, o bom imperador Alexandre não poupou esforços para completar vossa educação política. 

Animado, excitado por toda nossa literatura patriótica, pelos eslavófilos e pan-eslavistas, assim como pelos partidários da civilização burguesa do ocidente, por nossos fazendeiros e nossos liberais, utilizaram amplamente contra vocês de todos os meios que lhes foi legado pelos tártaros [7] e que, com o tempo, tem sido aperfeiçoada pela ciência burocrática dos alemães: espancamentos, torturas, enforcamento e morte por fome, cadeia perpétua, exílio em massa e trabalhos forçados, utilizando todos os meios disponíveis para medir vossas forças, vossa teimosia e vossa fé na causa do povo.

Nada os desmoralizou, vocês se mantiveram de pé: são fortes. Muitos de vossos camaradas morreram. Mas, por cada vítima enterrada, dez novos combatentes emergiram da terra... Aproxima-se o fim desse infame Império de todas as Rússias. De onde encontrais vossa força e vossa fé? Uma fé sem Deus, uma força sem esperança e objetivos pessoais! Onde encontrais essa capacidade de reduzir a nada, conscientemente, toda sua vida para enfrentar a tortura e a morte, sem vaidade ou retórica? Onde está a origem dessa idéia cruel de destruição e essa determinação friamente apaixonada perante a qual se põem um fim as energias e se gela todo o sangue de nossos inimigos?

Nossa literatura oficial e oficiosa, que pretende expressar o pensamento do povo russo, ficou completamente desmoralizada perante vocês. Eles não entendem nada.

Se vocês fossem servos fiéis ao imperador e ao Estado, espiões, carrascos, ladrões particulares ou públicos com ou sem direito a violência, canalhas inteligentes, liberais servis, assassinos de camponeses e polacos, se tivessem matado milhares ou dezenas de milhares de seres humanos, esta literatura teria os compreendido e anistiado, e se vocês tivessem os poucos meios e a vontade para provar sua resignação aos editores dos jornais, vos declarariam salvadores do Império, tal como fizeram com Muraviev o Carrasco.   

Tudo é coisa normal na civilização bizantino-tártaro e germano-burocrática de nosso Estado; tudo isso não entra em contradição com o patriotismo oficial e oficioso do Império de todas as Rússias.

Se vocês fossem uma juventude idealista, doutrinária ou sentimental; entretida em sonhar com a ciência e com a arte. Com a liberdade e a humanidade somente em teorias, em conversas ou em livros, eles os perdoariam, levando em conta que os dignos veteranos dessa velha literatura também já tiveram seus tempos de juventude. Eles também sonharam quando eram só estudantes.

Entusiasmados com as belas teorias, também prometeram dedicar suas vidas ao culto do ideal, aos atos nobres, a serviço da liberdade e da humanidade.

Mais tarde entrou em jogo a experiência, uma experiência adquirida no mundo mais desprezível que se possa imaginar, e sob a influência desse mundo se converteram no que são hoje, uns canalhas. Mas relembram com ternura os dias de sua juventude e perdoariam vocês, especialmente quando estivessem convencidos que, com a mesma experiência e sob a influência da mesma realidade, vocês iriam em breve superar sua maldade.

O que eles nunca perdoarão é que vocês não querem ser nem ladrões nem sonhadores. Vocês desprezam tanto esse mundo odioso, cuja realidade o oprime, como o mundo ideal que até os tempos atuais tem servido de refúgio para as “almas puras” contra o despotismo da realidade. Aqui está o que aterroriza nossa literatura “patriótica”. Não sabem o que vocês querem, nem aonde vão.

Em seu desespero, o Sr. editores de jornais em São Petersburgo e Moscou encontraram uma saída. Decidiram unanimemente que o movimento atual da juventude russa tem sua origem em intrigas polacas. Não poderíamos imaginar algo mais covarde nem mais estúpido.

Não é uma cruel e desprezível covardia estimular o carrasco contra a vítima que está sendo torturada? E, além disso, tem que ser realmente estúpido para não compreender o abismo que separa o programa da grande maioria dos patriotas polacos do programa de nossa juventude, representante da idéia socialista e revolucionária do povo russo.

Entre a maioria dos patriotas polacos e nós não há nada em comum, a não ser um único sentimento e meta: o ódio contra o Império de todas as Rússias, e a firme vontade de destruir-lo por todos os meios e com a máxima rapidez.

Esse é o único ponto que estamos de acordo. Mais um passo e entre os dois se abre o abismo: nós queremos a abolição definitiva de tudo o que constitui o Estado, tanto na Rússia como fora da Rússia; quanto aos polacos só estão trabalhando pela reconstrução do seu Estado histórico.

Em nossa opinião, o sonho dos polacos não é bom. Como todo Estado, por mais liberais e democráticos que sejam suas formas, esmaga as massas populares que trabalham, em benefício de uma minoria que não trabalha.

Os polacos sonham com o impossível, por que no futuro os Estado não se reconstruirão, e sim cairão. Sem saber disso, nem querer-lo, sonham com uma nova escravidão de seu povo e se conseguissem realizar esse sonho, não pela força popular, que não se prestaria a isso, senão com a ajuda das baionetas estrangeiras, se converterão tanto em nossos inimigos como opressores do seu próprio povo.

 Então, os converteremos em nome da revolução social e da liberdade de todo o mundo. Mas até esse ponto somos seus amigos e devemos ajudar-lhes, por que sua causa, a de destruição do Império de todas as Rússias, é também nossa causa.

Para os povos russos e não-russos presos hoje no Império de todas as Rússias, não existe inimigo mais perigoso e mais mortal que o próprio império.

Os patriotas polacos nunca entenderam, e por isso que sua influência sobre o movimento revolucionário da Rússia foi sempre nula. É uma lástima, pois existiriam vantagens evidentes tanto para eles como para nós merecer realmente a difamação da imprensa russa e ambos deveríamos conviver bem, ainda que seja apenas o primeiro ato que se anuncia da tragédia eslava; O que não nos impediria de separar-nos e inclusive de combater-vos nos três atos seguintes, à custa de reconciliarmos no quinto.

Não, não é a influência das intrigas polacas; é uma força de dimensões gigantescas que levanta e agita a juventude russa: o despertar da vida popular.

O reinado atual apresenta uma enorme semelhança com o reinado do csar Alexis, pai de Pedro o Grande, que apesar de sua imagem de bonachão, saqueou e destruiu o povo, para a maior glória do Estado e em proveito dos nobres e burocratas, assim como faz hoje o suposto emancipador dos camponeses, o excelente imperador Alexandro II.

Naquele momento, como agora, o infeliz povo, esmagado, torturado, levado a miséria suprema e dizimado pela fome, abandonou as aldeias e refugiou-se nas florestas. Hoje, como naquele momento, toda essa imensa população, finalmente tomando consciência da fraude imperial, se agita, esperando sua emancipação apenas pelos de baixo, pela via que lhe indicou, a exatos dois séculos, seu herói Stenka Razin[8].

Se sente que se aproxima um encontro sangrento, de uma última luta até a morte entre a Rússia popular e o Estado.

Quem triunfará desta vez? O povo sem dúvida nenhuma. Steka Razin era um herói, mas estava sozinho e acima de todos. Seu poder pessoal, realmente gigantesco, era, não obstante, insuficiente para resistir a força já em grande parte organizada do Estado. Morreu e todos morreram com ele. Agora as coisas serão diferentes. Não teremos provavelmente um herói tão poderoso e tão popular com Stenka Razin, que concentrou todas as forças das massas rebeldes em uma só pessoa. Mas será substituído por essa legião de jovens desclasados e anônimos que agora já se alimentam da vida popular e que permanecem extremamente unidos uns aos outros, pelo mesmo pensamento e a mesma paixão, e por um objetivo comum.

A garantia do triunfo popular reside na união da juventude com o povo.

Essa juventude só é invulnerável e forte porque sustenta seu pensamento e sua vontade implacável na paixão popular. Não busca seu próprio triunfo, senão o triunfo do povo. Tem atrás de si Stenka Razin. Não a pessoa do herói, senão o coletivo, e por isso mesmo invencível. Será toda essa magnífica juventude sobre a qual já planeja seu espírito.

Esse é o verdadeiro sentido do movimento atual, em aparência bastante inocente, e que apesar desse aspecto de inocência, alimenta-se do desgosto a todo nosso mundo oficial, oficioso e patrioticamente literário.

Amigos! Abandonem o quanto antes esse mundo condenado a destruição! Abandonem essas universidades, essas academias, essas escolas que agora os expulsam, elas nunca fizeram outra coisa que afastá-los do povo. Vão ao povo. É nele que deve estar sua carreira, sua vida e sua ciência. Aprenda em meio a essas massas com as mãos calejadas pelo trabalho como deveis servir a causa do povo. E lembre-se bem, irmãos, que a juventude culta não deve ser nem o amo, nem o protetor, nem o benfeitor, nem o ditador do povo, senão a vanguarda de sua emancipação espontânea, o coordenador e organizador dos seus esforços e de todas as forças populares.

Não se preocupem nesse momento em nome da qual se pretenderia vincular, confundindo-se. Esta ciência oficial deve perecer com o mundo do qual é expressão e ao qual serve; em seu lugar, uma ciência nova, racional e viva, surgirá depois da vitória do povo, exatamente das profundezas da vida popular liberada de suas cadeias.

Tal é a fé dos melhores homens do Ocidente, onde, assim como na Rússia, o velho mundo dos Estados fundados na religião, na metafísica, na jurisprudência, em uma palavra, na civilização burguesa, com seu complemento indispensável: o direito da propriedade privada hereditária e da família jurídica entra em colapso, se preparando para deixar seu posto ao mundo internacional e livremente organizado dos trabalhadores.

Mentem aqueles que dizem que a Europa encontra-se mergulhado em um sono profundo. Bem ao contrário, a Europa desperta, e só podem ser verdadeiramente surdo e cego para não dar-se conta da iminência de uma luta suprema.

Ao se organizar para esta luta e dar as mãos para além das fronteiras de todos os Estados, o mundo dos trabalhadores da Europa e da América os chama para uma fraternal aliança.

Genebra, maio de 1869.

Miguel Bakunin